OFICINA
SOBRE O MEIO BIÓTICO
Etnobotânica
Maria
Aparecida Corrêa dos Santos
1.
Recursos naturais e seus usos.
Recursos
naturais são materiais encontrados na natureza
e que são usados para a obtenção
de benefícios. Esses recursos estão distribuídos
nos mesmos reinos que já conhecemos e podem ser
transformados em verdadeiras riquezas.
Geralmente o ser humano os utiliza para tornar a sua vida
mais fácil, empregando esses recursos em diversas
atividades como, por exemplo:
nos cuidados com a saúde
na alimentação
na construção de casas e barcos
na fabricação utensílios
na produção de artefatos
na higiene pessoal
na limpeza de suas casas
como força de trabalho
Os recursos naturais podem ser usados de diferentes maneiras
e, em alguns casos, podem durar para sempre. Alguns recursos
estão sempre se renovando na natureza. Quando isso
acontece, dizemos que eles são recursos naturais
renováveis: as plantas e os animais são
exemplos de recursos naturais renováveis, pois
eles estão sempre nascendo novos plantas e novos
animais.

AÇAÍ
– RECURSO NATUAL RENOVÁVEL |
BARRO
– RECURSO NATURAL NÃO RENOVÁVEL |
Quando os recursos não conseguem
se reproduzir, quer dizer, após o seu uso
eles acabam, dizemos que eles são recursos
naturais não renováveis: os minerais,
como o ouro, o petróleo, o barro e uma rocha
são exemplos desse tipo de recurso.
1.1 Porque estudar recursos
naturais?
Um dos objetivos principais desse estudo é
identificar produtos que possam ser usados para
o desenvolvimento da comunidade, sem, contudo, colocar
em risco a sua existência. Esse tipo de estudo
geralmente é feito por pesquisadores, mas
também pode ser feito por membros da comunidade
que tenham interesse em organizar e documentar seus
conhecimentos, de modo que: 1) as informações
possam ser facilmente acessadas pelos membros da
comunidade; 2) a troca de conhecimentos com outros
usuários seja facilitada, aumentando as possibilidades
de uso das espécies; 3) os produtos com potencial
econômico sejam mais fácil e rapidamente
identificados.
O aumento das possibilidades de uso de uma determinada
espécie pode incrementar as atividades de
diferentes locais, levando a um maior desenvolvimento
social, econômico e cultural. Por outro lado,
a diversificação de atividades e produtos
envolverá mais gente e fará com que
sempre haja ocupação para um maior
número de pessoas.
No que se refere à plantas medicinais, são
listadas espécies que poderão ser
testadas para os fins relatados pelas comunidades,
em instituições de pesquisa, e indicadas
espécies que poderão ser usadas com
maior segurança e eficácia.
1.2 Recursos vegetais
São recursos naturais que pertencem ao reino
vegetal; são renováveis, isso quer
dizer que quando usados de maneira apropriada podem
durar indefinidamente.

ÓLEO
DE COPAÍBA, LEITE DE AMAPÁ,
FRUTO DE AÇAÍ
PRODUTOS QUE NÃO COMPROMETEM A EXISTÊNCIA
DO RECURSO, QUANDO RETIRADOS DE MANEIRA ADEQUADA
|
O uso apropriado de um recurso vai
depender do tipo de relacionamento que as pessoas
mantém com a natureza. A relação
entre o ser humano e a planta é estudada
em uma matéria chamada etnobotânica.
A etnobotânica leva em consideração
o conhecimento das pessoas mais idosas e das culturas
mais antigas que, com o passar do tempo, escolheram
a melhor maneira de usar esta ou aquela planta e
qual planta é melhor para este ou aquele
fim; ela valoriza a tradição no uso
de espécies vegetais como uma forma importante
de conhecimento da natureza.
Entre os diferentes usos que podem ser dados á
espécies vegetais está a produção
de remédios, feitos com plantas medicinais.
1.3 Importância das plantas medicinais
Plantas
medicinais são plantas utilizadas nos cuidados
com a saúde. Desde de tempos muito antigos
nossos ancestrais (pais, avós, bisavós,
...) utilizavam plantas como remédios, ou
por não terem outras opções,
ou porque os outros tipos de remédios eram
muito caros ou difíceis de se conseguir.
Ainda hoje, apesar do grande numero de “remédios
de farmácia”, plantas são usadas
para tratar doenças tanto no interior como
na cidade. Isso acontece graças ao respeito
que algumas pessoas mantém pelo conhecimento
de alguém que já viveu mais e passou
por mais experiências que elas.
|

ANDIROBA
E VERÔNICA VERMELHA: PLANTAS MEDICINAIS ABUNDANTES
NO BAILIQUE |
A
valorização do conhecimento acumulado
por pessoas mais idosas e por culturas mais antigas
sobre o uso de plantas fez com que muitas delas
servissem como matéria-prima para a produção
de vários dos “remédios de farmácia”
que nós utilizamos.
1.4
Implicações das diferenças
locais no uso de plantas medicinais
Nem todas as pessoas conhecem as mesmas plantas.
Os diferentes povos que vieram de outras regiões
do mundo e contribuíram para a formação
do povo brasileiro, trouxeram consigo o conhecimento
sobre algumas plantas que já usavam em sua
terra natal. Esses conhecimentos acabaram sendo
somados aos que já existiam e eram de domínio
dos povos nativos do Brasil. Assim sendo, algumas
espécies que eram conhecidas por um determinado
nome, passaram a ter outros nomes e outros usos;
também aconteceu de uma planta receber o
mesmo nome que já era dado a uma planta diferente.
Isso dependia da pessoa que tinha o conhecimento
sobre estas plantas e do lugar de onde ela vinha.
Então podemos chegar a conclusão que:
Uma planta pode vários nomes populares
Plantas diferentes podem ter o mesmo nome popular
Os usos geralmente são associados aos nomes
populares
Para diminuir os problemas relacionados aos nomes
das plantas, os estudiosos criaram a nomenclatura
científica. Com a nomenclatura científica
uma planta passou a ter, além do nome popular,
um nome que é válido em todos os lugares
e que é exclusivo para cada planta. O nome
científico geralmente é dado em função
de características observadas na planta.
2.
Métodos de coleta de dados etnobotânicos.
 |
Em
geral as pessoas que tem mais informações
sobre o uso de plantas que servem para este
ou aquele fim, em uma determinada comunidade,
são as mais idosas e/ou as que moram
a mais tempo no local. Essas pessoas são
facilmente apontadas pelos vizinhos por
sua experiência e tradição
no uso de plantas e são chamadas
de informantes.
|
As
informações sobre as espécies
e seus usos podem ser obtidas através de
conversas, de caminhadas no campo, a partir de uma
lista de plantas ou, de preferência, usando
todos esses métodos. O uso de questionários
agiliza bastante o trabalho fazendo com que nenhuma
pergunta seja esquecida ou fique sem resposta. Esse
questionário deve abordar questões
relacionadas a quem está pegando as informações,
a quem está dando as informações,
à planta que está sendo indicada e
ao uso que é feito dessa planta.
2.1
Que informações sobre plantas medicinais
devem ser coletadas
Para que se possa escolher espécies com potencial
para desenvolvimento é necessário
pesquisar as plantas, de preferência em seu
ambiente nativo. Para isso não se pode esquecer
das informações referentes ao seu
uso, incluindo a parte usada, o modo de preparo,
a forma de uso e para quê ela é usada.
As plantas pesquisadas precisam ser descritas de
modo que possam ser identificadas por outras pessoas.
Para que isso ocorra, não se deve esquecer
de pegar informações sobre tipo de
planta, cheiros, cor da flor, forma do fruto, o
ambiente onde ela vive, entre outras coisas.
Seguindo essas orientações, ao final
do trabalho é possível que se tenha
respostas para as seguintes questões:
Tipo de lugar onde a planta existe
Época do ano em que ele é mais abundante
Melhor época para plantio, onde e como plantar
Melhor maneira de preparar o remédio para
uso
Outras possibilidades de uso para a mesma planta
2.2
Cuidados no uso de plantas medicinais
O uso de remédios feitos com plantas envolve
a coleta adequada, a quantidade certa, o modo de
preparo e a via de administração mais
apropriada para a doença que se queira curar.
Todas essas informações fazem parte
da receita e são fornecidas pela pessoa que
se dedica ao ofício de tratar doenças
e preparar remédios com plantas.
Devemos prestar atenção para o fato
de que, muitas vezes, uma parte da planta é
“boa” para alguma coisa e “ruim”
para outra (por exemplo, a folha é boa mas
a raiz faz mal); outras vezes é preciso usar
várias partes da planta ao mesmo tempo ou
misturar várias plantas para que se consiga
o efeito desejado. Então, a pessoa que vai
coletar as informações deve estar
atenta para todos os detalhes da receita, como os
que estão numerados a seguir:
Que
parte da planta é usada como remédio
(folha, raiz, leite, flor, ...)
Como coletar a parte da planta usada (cortando,
arrancando, ...)
Como preparar o remédio (ferver, colocar
na água quente, ...)
Que quantidade de planta é usada na receita
(uma folha, uma colher, ...)
Como cuidar da planta antes de usar (lavar, picar,
...)
O que e em que quantidade misturar na preparação
(água, vinho, outra planta/um copo, um litro,
5 folhas,...)
Que quantidade do remédio deve ser usada
(1 colher, uma xícara, ...)
Quantas vezes ao dia usar o remédio (3 vezes,
1 vez, ...)
Por quanto tempo usar o remédio (1 dia, uma
semana, até ficar bom, ...)
É importante usar as plantas da maneira correta
ou isso pode significar que a receita não
vai funcionar ou, o que é mais grave, o remédio
pode fazer mal a quem o utilize. Portanto, ao decidir
usar uma planta como remédio é preciso
que se tome os seguintes cuidados:
Sempre usar a parte da planta indicada na receita
Usar apenas a quantidade de planta indicada na receita
(uma folha, um respeitar a forma de preparo indicada
(chá, infusão, ungüento, ...)
É importante saber se a planta deve ser usada
fresca ou seca
Sempre usar planta de aspecto saudável e
limpo
Usar o remédio na quantidade e intervalos
indicados (1 colher/dia, 1 copo de hora em hora,
...)
Ramo,...)
Usar o remédio pelo tempo indicado (1 dia,
uma semana, ...)
Sempre usar o remédio da maneira indicada
(bebido, banho, ...)
3.
Cuidados na coleta e armazenagem de plantas para
uso medicinal
Algumas plantas podem ser mantidas em hortas, próximas
ao usuários. Outras precisarão ser
guardadas para uso posterior. |
|
Para
que uma planta tenha o efeito desejado, é
preciso que ela seja coletada e guardada de maneira
adequada até o seu uso. Para isso, devemos
tomar alguns cuidados com o material que vai ser
usado:
Coletar na época certa para que se tenha
o melhor resultado possível
Escolher partes saudáveis
Evitar coletas em beira de estrada, próximo
a esgotos ou outros locais que possam levar a
contaminação do material
Nunca coletar mais do que vai ser usado
Secar a planta em lugar limpo, seco, arejado e
à sombra
Guardar o material em recipientes bem limpos e
secos
Não deixar o material coletado guardado
por um tempo muito grande
Guardar tudo fora do alcance de crianças
3.1
Preparação de material testemunho
 |
Amostras
das plantas indicadas pelos informantes
devem ser guardadas para que possam ser
identificadas por outros usuários,
curiosos ou estudiosos. Isso pode ser feito
com a criação de um herbário,
onde serão guardados exemplares das
plantas usadas (exsicatas), que estarão
sempre disponíveis e ao alcance de
quem queira tirar dúvidas quanto
a identidade da espécie.
A parte coletada deve dar uma boa idéia
de como a planta é na natureza. Para
a identificação da espécie
é importante que seja coletada uma
amostra com flor e/ou fruto.
A planta coletada deve receber um número
de coleta, que será diferente para
cada planta coletada e para cada coletor
e servirá para identificar aquela
amostra. A preparação das
exsicatas precisa seguir certas normas,
que são, basicamente as seguintes:
|
Coletar
3 amostras com cerca de 30 a 40 centímetros,
saudável, de preferência com flor
(ou fruto, semente, raiz)
Se a planta for uma erva pequena, deve ser coletada
inteira, incluindo a raiz
Dar especial atenção à parte
usada na preparação de remédios
Anotar, na ficha da exsicata, o número
da coleta e as informações que possam
ser perdidas com o tempo e com a secagem da planta,
tais como: altura, cores, odores.
Após a preparação, esse material
será incluído em um herbário
e ficará disponível para consultas
e estudos.
 |
ESQUEMA
DE EXSICATA PRONTA PARA INCLUIR NO HERBÁRIO |
4.
Produtos esperados
Com o treinamento e a execução do
projeto, os participantes deverão estar aptos
a produzir materiais educacionais diretamente relacionados
com seus hábitos e ambiente imediato (o arquipélago
do Bailique) e que poderão ser utilizados
como apoio em sala de aula. Pode-se sugerir que
os participantes do projeto façam uma caracterização
do arquipélago, ou somente de sua comunidade,
através de textos, desenhos, conforme lhes
seja mais fácil.
Poderão ser produzidos manuais com informações
sistematizadas sobre as espécies.
A partir da análise dos resultados, poderá
ser incentivada a preparação ou introdução
das espécies mais citadas em hortas de plantas
medicinais em que as plantas estarão identificadas
por seus nomes populares e científicos.
Ao longo do desenvolvimento do projeto, serão
definidos espaços em que os participantes
poderão expor os produtos do seu trabalho
para visita e/ou consulta. Sugerimos que sejam criados,
na escala permitida pelo projeto, herbários
e museus, além de painéis e boletins
informativos em cada uma das comunidades.
Seria de grande relevância a troca de material
entre as comunidades envolvidas no projeto e que
estes resultados fossem apresentados de forma bem
planejada para as demais comunidades, inclusive
para as que não foram abrangidas pelo projeto.
Bibliografia
consultada:
AMOROSO, M.C.M.
1996. A abordagem etnobotânica na pesquisa
de plantas medicinais. In: Plantas medicinais:
arte e ciência. Um guia de estudo interdisciplinar.
São Paulo: Editora da UNESP. pp. 47-68.
LIN, C.M. 1996. Coleta de plantas medicinais.
In: Plantas medicinais: arte e ciência.
Um guia de estudo interdisciplinar. São
Paulo: Editora da UNESP. pp. 69-86.
ELISABETSKY, E. et al. 19_? Manual de coleta de
plantas em reservas extrativistas.
LING, C.M. s/d. Aspectos etnobotânicos de
plantas medicinais na Reserva Extrativista Chico
Mendes. http//www.nybg.org/search/acre/...
03/01/03.
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